Justiça determina suspensão das cobranças das tarifas de energia elétrica em Alta Floresta por 30 dias


DECISAO

Cuida-se de cumprimento de sentença em ação civil pública proposta pelo Ministério Público de Rondônia em face de ENERGISA SV\.
A ação ter por objeto a regularização do fornecimento de energia elétrica na Comarca de Alta Floresta D’Oeste, a qual possui interrupções constantes, violando o princípio da continuidade do serviço essencial.

Realizada audiência foi determinada produção de prova pericial com o objeto de questionamento proferido pelo Magistrado “registro que o laudo pericial devera apurar a interrupção do fornecimento, por hora ou fração, no município de Alta Floresta D’Oeste/RO englobando o período posterior aos laudos de ID 13541281 e 13541296 até a presente data (29\01\2020)”, para a qual foi nomeado o Perito o Engenheiro Eletricista THIAGO SOUZA FRANCO, CREA: 7629D/RO, sendo que o Expert aceitou o encargo e fixado pelo Juizo o prazo de conclusão do laudo em 30 (trinta) dias, sendo autorizado o levantamento de 50% dos honorários (ID41569456).

Embargos de declaração da executada (ID 34543736), os quais foram tidas por protetores (ID36315759) e aplicada multa de 2% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 1.026, §2°, do CPC/15, bem como pagamento de multa por litigância de má-fé, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 80, incisos IV, V e VI c\c art.81, caput e §3°, ambos do CPC.

O Ministério Publico requereu a suspensão da cobrança das faturas de energia elétrica dos consumidores domésticos da Comarca, pelo prazo de 03 (três) meses (ID31018594 – Pag. 15). Novo pedido do Parquet com requerimento de suspensão das cobranças (ID 41459903), caso o serviço não fosse tido por regular, no prazo de 05 (cinco) dias.

A executada requereu audiência de conciliação com o Ministério Público (ID42601604), sendo que o este manifestou desinteresse em nova audiência. Os autos foram suspenses por 60 (sessenta) dias, tendo o Juízo proferido despacho aduzindo que faria a análise do requerimento de suspensão das cobranças para após a perícia (ID44907806).

Novo pedido do Ministério Público com requerimento de suspensão das cobranças (ID50382582) com anexo de noticia informada no site local que rotadores do distrito de Izidolândia, nesta Comarca estavam sem energia elétrica há 06 (seis) dias. O Juízo se manifestou deferindo em parte a pretensão do MP, determinando a regularização do serviço público, no prazo de 48 boras, sob pena de suspensão das cobranças por 01 mês.

Devidamente intimada a executada, conforme certificou o cartório (ID 50665824), quedou-se inerte. O Ministério Público juntou certidão afirmando que no dia 05\11\2020 ocorreram interrupções de energia nos seguintes horários: 18h40min as 18h45min; 18h46min as 18h49min; 18h50min as 18h52min; 19h08min as 19h09min e no dia 07\11\2020 ocorreram interrupção e queda de energia nos seguintes horários: Queda de energia as 15h55min; interrupção de energia das 16h05min às 16h07min. Vieram conclusos. DECIDO.

Primeiramente e precise esclarecer que a relação entre os munícipes desta Comarca e a Concessionaria de Serviço Público ENERGISA S\A e baseada na legislação consumerista, como é o entendimento uníssono do Superior Tribunal de Justiça, veja-se:

A relação entre concessionaria de serviço público e o usuário final para o fornecimento de serviços públicos essenciais e consumerista, sendo cabível a aplicação do Código de Defesa do
Consumidor. Precedentes: Resp. 1595018/RJ, Rel.

Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 18/08/2016, DJe 29/08/2016; AgRg no REsp 1421766/RS, Rel. Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1a Região), Primeira Turma, julgado em 17/12/2015, DJe 04/02/2016; REsp 1396925/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 05/11/2014, DJe 26/02/2015; AgRg no AREsp 479632/MS, Rel. Ministra Assusete Magalhaes, Segunda Turma, julgado em 25/11/2014, DJe 03/12/2014; AgRg no AREsp 546265/RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 07/10/2014, DJe 15/10/2014; AgRg no AREsp 372327/RJ, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, julgado em 05/06/2014, DJe 18/06/2014.

A prestação do serviço de fornecimento de energia elétrica se caracteriza por uma relação de consume e além disso, a prestação de um serviço de natureza essencial. Por sua vez, a essencialidade do serviço se define segundo a sua indispensabilidade para a satisfação de necessidades básicas e inadiáveis da comunidade, sem os quais restariam comprometidos, especialmente, a saúde da população e o meio ambiente equilibrado. Isto e, fatores diretamente relacionados a dignidade da pessoa humana e, em última análise, ao próprio direito a vida. Daí a necessidade de que o fornecimento desses serviços seja continue, nos termos do artigo 22 do CDC.

O fornecimento de energia elétrica e serviço essencial e deve ser prestado de forma adequada, eficiente e continua sendo licita a sua interrupção em caso de inadimplemento do usuário, desde que precedida de prévio aviso. Para alguns autores, como Rizzatto Nunes, os serviços públicos essenciais não podem ser interrompidos sob pretexto algum, pois a lei consumerista não faz nenhuma ressalva em seu texto para autorizar a suspensão do serviço (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 8a ed., São Paulo: RT, 2015).

Já e pacifico no âmbito dos Tribunal Superiores a possibilidade de indenização por danos morais pela morosidade no restabelecimento da energia elétrica aos consumidores, conforme AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL N° 1.368.466 – CE, 1.581.106 – RS, AREsp 1368466 – CE entre tantos outros precedentes, em razão do princípio da continuidade do serviço público essencial.

O princípio da continuidade do serviço público, como e de se depreender, significa que os serviços públicos não devem ser interrompidos, dada a sua natureza e relevância, pois são atividades material escolhidas e qualificadas pelo legislador como tais em dado momento histórico, em razão das necessidades de determinada coletividade. Como a qualificação, por lei, de determinadas atividades como sérvios públicos tem o condão de retira-las do domínio econômico por afigurarem-se imprescindíveis a coletividade – motive pelo qual sua titularidade passar a ser do Estado e consequentemente o seu regime jurídico norteador, regime de direito público – devem as mesmas ser continuas, consistindo tal dever em um dos princípios jurídicos próprios desse regime, qual seja o princípio da continuidade.

Referido princípio decorre da indisponibilidade, pela Administração Publica, do interesse público uma das colunas de sustentação ou sobre princípios do regime jurídico-administrativo No ordenamento jurídico brasileiro, como não poderia deixar de ser, ante a imprescindibilidade das atividades nele positivadas como serviços públicos, por meio do dever constitucional de manter serviço adequado – previsto no art. 175, IV, da Constituição da Republica – cuja regulamentação acabou por engloba-lo juntamente com outros princípios jurídicos norteadores da prestação dos serviços públicos. No piano infraconstitucional substancia-se no art. 6°, § 1°, da Lei 8.987/1995 definiu-o como uma das características do serviço adequado e o seu art. art. 7°, I assim dispôs: Art. 7° Sem prejuízo do disposto na Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, são direitos e obrigardes dos usuários:

I – receber serviço adequado”.
Ainda no piano infraconstitucional, o princípio da continuidade do serviço público foi ainda positivado no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990) promulgado em obediência aos art. 5°, XXXII e 170, V, da Constituição da Republica, nos seus art. 6°, X e 22 que assim determinam:

Art. 6° São direitos básicos do consumidor: (…) X – a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. (…) Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionarias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, continues”. Para Celso Antonio Bandeira de Mello o princípio da continuidade do serviço público significa “a impossibilidade de sua interrupção e o pleno direito dos administrados a que nao seja suspense ou interrompido.

Para esse jurista trata-se de” um subprincípio, ou, se quiser, principio derivado, que decorre da obrigatoriedade do desempenho de atividade administrativa” que, por sua vez deriva do princípio fundamental da “indisponibilidade, para a Administração, dos interesses públicos”.

Todavia, uma coisa e o direito positivado, outra muito diferente e a realidade fática. O filosofo Baruch Spinoza dizia “o direito vai até onde for a potência para poder exerce-lo, defende-lo e fazer valer contra os outros” (MARILENA CHAUI, Espinosa, uma filosofia da liberdade, pg. 36, editora logos). Portanto, não ha direito sem o poder de exerce-lo, o que no Estado Democrático de Direito salvo raríssimas exceções (desforço imediato e legitima defesa) não e autorizado, ficando a cargo do Estado.

Em que pese o direito positive dos munícipes desta Comarca, a concessionaria de serviço público ENERGISA S\A não os presta voluntariamente, sendo o caso de o Poder Judiciário atuar para efetivar os direitos consumeristas já discriminados alhures. O Ministério Público ajuizou a presente ação civil pública no ano de 2002. As pessoas que nasceram neste ano (2002) hoje já são imputáveis criminalmente e o problema de falta de regularidade no fornecimento de energia elétrica continua
presente.

O único objeto da AGP, qual seja, a regularidade na prestação do serviço público continua sem a devida prestação, ainda que por diversas vezes já tenha sido tentado acordo, prestação voluntaria, dialogo, sem êxito. No ponto, devidamente intimada a regularizar o serviço, a executada quedou-se inerte.

Conforme foi certificado pelo Ministério Público, no interregno de alguns dias várias vezes a energia elétrica foi cessada abruptamente. E indiscutível que neste Município há violações ao princípio da continuidade dos serviços essenciais encartado no art. 22, do Código de Defesa do Consumidor.

Conforme informações de conhecimento público, há distritos no Município que ficaram 06 (seis) dias sem energia elétrica. Inaceitável, pois o serviço deve ser continuo. A insatisfação dos munícipes com a qualidade do serviço de energia elétrica e evidente, contudo, muito pouco (ou nada) podem fazer, como reclamações diretas e ouvidorias, mas nada além disso, pois Ilhes falta poder para exercer seu direito, restando apenas se habituar com o irregular e cada vez mais descontinuado serviço público essencial, mas os valores cobrados – (ao contrário do serviço) -, cada vez mais custosos.

No ponto, o consumidor e vulnerável presumidamente por lei (GDC) e diante da situação vivenciada neste Município, também e hipossuficiente, visto que e uma situação que determina a falta de suficiência para realizar ou praticar algum ato, ou seja, e uma situação de inferioridade que indica uma falta de capacidade para realizar algo, pois só resta a situação de impotência e inferioridade na relação de consume, diante do esgotamento das vias sem resolução do problema. Portanto, resta o apelo ao Poder Judiciário, ao exercício do direito de ação para a tentativa de valer a lei.

Contudo, diversas vezes este Juízo já intimou a executada para regularizar o serviço, realização de audiências conciliatórias, enfiar, não se ultrapassa o piano discursiva, mas nada de efetivo ocorre para alteração da situação fática. Registre-se que as medidas atípicas a serem adotadas pelo Juízo no presente caso, não violam os direitos e garantias fundamentas da executada, bem como são providencias razoáveis e proporcionais a conduta processual adotada pela executada. O Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência firmada acerca da possibilidade, veja-se:

EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Direito Constitucional. Ação civil pública. Criança e adolescente. Conselho tutelar. Implementarão de políticas públicas. Possibilidade.

Violação do princípio da separação dos poderes. Não ocorrência. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade. Precedentes. 1. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração publica adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2° da Constituição Federal. 2. O recurso extraordinário não se presta para o reexame do conjunto fatico-probatorio da causa. Incidência da Sumula n° 279/STF. 3. Agravo regimental não provido. (ARE 827568 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 15/03/2016, ACORDAO ELETRONICO DJe-098 DIVULG 13-05-“016 PUBLIC 16-05-2016).

Em que pese a concessionaria não ser Administração Publica propriamente dita, presta serviço de natureza publica, mediante regime de concessão, não podendo ser-lhe aplicado entendimento diverso, pois goza de menos privilégios do que a Administração direta ou indireta. Sobre o assunto, posicionou-se o Superior Tribunal de Justiga no Informative n. 631, publicado em 14 de setembro de 2018:

O CPC de 2015, em homenagem ao princípio do resultado na execução, inovou o ordenamento jurídico com a previsão, em seu art. 139, IV, de medidas executivas atípica s, tendentes a satisfação da obrigação exequenda, inclusive as de pagar quantia certa. As modernas regras de processo, no entanto, ainda respaldadas pela busca da efetividade jurisdicional, em nenhuma circunstância, poderão se distanciar dos ditames constitucionais, apenas sendo possível a implementação de comandos não discricionários ou que restrinjam direitos individual de forma razoável. Assim, no caso concrete, após esgotados todos os meios (…) Para assegurar o cumprimento de ordem judicial, deve o magistrado eleger a medida que seja necessária, logica e proporcional (…) Nesse sentido, para que o julgador utilize de meios executivos atípicos, a decisão deve ser fundamentada e sujeita ao contraditório, demonstrando a excepcionalidade da medida adotada em razão da ineficácia dos meios executivos típicos, sob pena de configurar-se como sanga o processual (…).

Aliás, o próprio Tribunal de Justiça local tem entendimento de que se pode utilizar de medidas atípicas para buscar o objetivo de satisfação da execução, o que inclui suspensões de CNH, passaporte, cartão de credito. No caso dos autos, nada disso e possível, pois se trata de uma concessionaria, sendo o meio plausível a suspensão das cobranças de energia elétrica.

Vale relembrar que já houve bloqueio de valores no montante de R$ 1.423.172,74 (um milhão, quatrocentos e vinte e três mil, cento e setenta e dois reais e setenta e quatro centavos) referente a indenização (ID 21096263) e transferido em favor do Fundo de Reconstituição de Bens Lesados, nos termos do art. 13, caput, da Lei n. 7.347/85 (ID 28655312), porém não se obteve a satisfação integral da obrigação.

Ademais, em caso semelhante nesta Comarca tal medida excepcional foi tomada, acerca da suspensão da cobrança de tarifas de agua pelo Serviço Autônomo de Agua e Esgoto (SAAB) até que se garantisse o fornecimento continue) de agua tratada a população, conforme decisão de fls. 423-425 proferida nos autos da ação civil pública n. 0003037-78.2012.8.22.0017.

For fim, estando presentes os requisites legais, DEFIRO o pedido do Ministério Público e com fundamento no art. 139, inciso IV, do CPC, DETERMINO A SUSPENSAO DAS COBRANQAS DE TARIFAS DE ENERGIA ELETRICA PELA EXECUTADA ENERGISA S\A apenas com relação aos usuários domésticos desta Comarca, pelo prazo de 30 (trinta) dias, sem prejuízo de dilação do prazo, caso o serviço não seja prestado de forma adequada e continua.

Dê-se ciência a executada para cumprimento da obrigação de não fazer. Em caso de descumprimento, devidamente comprovado, fixo multa no importe de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) por dia de descumprimento. Na hipótese de descumprimento, voltem os autos conclusos. Oficie-se o Perito Engenheiro Eletricista THIAGO SOUZA FRANCO, CREA: 7629D/RO para que apresente o laudo pericial, no prazo de 15 (quinze) dias, visto que já transcorreu o prazo que Lhe foi concedido em audiência.

Oficie-se também no local de funcionamento da ENERGISA S\A desta Comarca. Intimem-se, via DJE. Dê-se publicidade desta decisão por meio de diário oficial e sites de informação local a fim de que seja noticiado eventual descumprimento da decisão pela executada.

Ciência ao Ministério Público.

SERVE DE MANDADO\OFICIO\PRECATORIA

Alta Floresta D’Oeste quarta-feira, 11 de novembro de 2020 as 12:01.

Fabrizio Amorim de Menezes
Juiz(a) de Direito

 


Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Sahifa Theme License is not validated, Go to the theme options page to validate the license, You need a single license for each domain name.